Checar o pulso é uma das ações de grande importância no manejo da reanimação cardiopulmonar(RCP). Inicialmente para o reconhecimento da parada cardiorrespiratoria (PCR) e depois ao final de cada ciclo, quando avaliamos se houve retorno da circulação espontânea (RCE). Apesar de parecer uma habilidade simples, e ter limitações, sua importância e como ela impacta diretamente… Leia mais Checa o pulso!
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Checar o pulso é uma das ações de grande importância no manejo da reanimação cardiopulmonar(RCP). Inicialmente para o reconhecimento da parada cardiorrespiratoria (PCR) e depois ao final de cada ciclo, quando avaliamos se houve retorno da circulação espontânea (RCE).
Apesar de parecer uma habilidade simples, e ter limitações, sua importância e como ela impacta diretamente no sucesso da reanimação faz com que seja necessário otimizar seu uso enquanto não temos disponível meios mais fidedignos e eficientes de avaliação de RCE, como POCUS, EtCO2, PAI, etc.
(que serão abordados em textos futuros)
RECONHECENDO UMA PCR
(texto voltado para atendimento intra-hospitalar)
A situação mais crítica na emergência é a parada cardíaca. Todo emergêncista tem que estar o tempo todo em alerta para reconhecer essa situação e iniciar o protocolo de tratamento de forma sequencial e automática. Pois as ações que mais impactam na sobrevida desses pacientes precisam ser realizadas o mais rápido possível. O tempo é precioso.
Sem batimento cardíaco, o paciente sofre (entre outras alterações) colapso do SNC. Logo, ao presenciar um paciente com rebaixamento do nível de consciência, que não responde aos chamados, imediatamente procuramos por seu pulso arterial. Esse ato deve se tornar um reflexo para o emergencista e tem que vim antes mesmo da monitorização dos sinais vitais, antes de se pensar na via aérea! Antes de qualquer outra ação.
Qual o melhor lugar para avaliar a presença de pulso?
Pulso da circulação central!
Porque não se pode usar pulso das regiões periféricas? A presença do pulso radial é um excelente marcador da presença de batimento cardíaco, afinal ele só está presente quando a PAS está acima de 80mmHg. Mas a ausência deste pulso não significa necessariamente uma PCR, podendo representar apenas um hipotensão mais severa. Logo, pela necessidade na agilidade do diagnóstico, devemos focar nossa atenção, em pulsos da região da central.
Pulso carotídeo ou femoral? Em casos de PAS entre 60 e 70mmHg, somente o pulso carotídeo pode ser identificado, em um estudo que avaliou pacientes vítimas de trauma. Quando a PAS ultrapassou 70 a 80mmHg o pulso femoral também ficava mais facilmente identificável. (4) Tanto o pulso femoral quanto o carotídeo podem ser usados como sítios de avaliação de RCE durante as checagens de pulso, porém a região carotídea tem maior sensibilidade do que a região femoral, provavelmente por suas condições anatômicas. (1,4) É importante apenas ter o cuidado de não confundir movimentos na região cervical decorrentes da ventilação e de movimentos respiratórios como Gasping com pulsação. (4)
Lembrando mais uma vez que a função da checagem de pulso deve ser delegada para uma pessoa experiente e que seja predeterminada e preparada para isso, antes do final do ciclo de RCP. Para estudantes sugiro treino constante, sempre que possível sentir e comparar as sensações do pulso dos pacientes em estágios diferentes de choque e estabilidade.
COMO REALIZAR?
Pulso carotídeo
Sempre usar no mínimo duas polpas digitais, indicador e dedo médio. Na altura da tireoide, deslizar os dedos até um sulco entre a cartilagem tireoide e a borda do músculo esternocleidomastoideo.
Novo método de verificar pulso carotídeo.(5)
A mão é colocada de uma forma que a porção média dos dedos fiquem sobre a região tireoide, e as pontas dos dedos médio e indicador alcancem o mesmo sulco entre a cartilagem tireoide e o músculo esternocleidomastoideo, conforme figura acima.
Pulso femoral
Na região inguinal, procurar pelo pulso aproximadamente no terço médio.
NÃO SE DEMORE!
Os guidelines de reanimação ACLS/AHA e ERC, orientam não se demorar mais do que 10 segundos para confirmar a presença ou ausência de pulso central e em caso de dúvida, devemos iniciar a RCP imediatamente. Pois os riscos de se realizar uma massagem cardíaca em um paciente que não está em PCR, ou seja apenas muito hipotenso, é mínimo em comparação a não realização da RCP num paciente em PCR.
Na dúvida inicie a massagem cardíaca imediatamente!
RESPIRAÇÃO AGONAL/GASPPING
Gasping é um padrão respiratório caracterizado por respiração agônica, ineficaz, com movimentos de curta duração, também descritos como respiração ruidosa, espasmos respiratórios, etc. Gasping é uma última medida que o corpo adota para tentar se salvar.
É importante difundir o conhecimento a seu respeito, pois pode ser confundido com respiração eficaz e atrasar o reconhecimento da PCR. Quando o paciente apresenta esse padrão respiratório e não for identificado pulso central em menos de 10 segundos, a RCP deve ser iniciada imediatamente.
Gasping é muito comum após a parada cardíaca e ocorre em torno de 55% das PCR, mais comumente nos ritmos FV do que nos outros ritmos. (7) Parece estar relacionado ainda a fase elétrica da PCR, por estar presente mais frequente nos primeiros minutos, diminuindo sua incidência conforme maior o tempo da PCR. Adicionalmente, a presença de gasping está associado com um aumento na sobrevida com alta hospitalar. Houve 39% de sobrevida no grupo de pacientes encontrados em gasping no início da RCP, contra 9% nos que não apresentavam. (6) Ainda não se sabe muito à respeito desse sinal, seria um evento protetivo, ou simplesmente um marcador de precocidade da PCR?
Vídeo encontrados no YouTube na descrição gasping aqui
Possíveis efeitos cardiovasculares benéficos do gasping incluem: melhor troca gasosa pulmonar, aumento do retorno venoso para o coração, aumento do debito cardíaco e contratilidade cardíaca e aumento da pressão da aorta e da pressão de perfusão coronariana (PPC). (7)
Gasping é igual a Parada Cardiaca até que se prove o contrário!
REANIMAÇAO CARDIOPULMONAR INDUZINDO CONSCIÊNCIA
Ao se iniciar massagem cardíaca imediatamente após uma PCR, sendo essa de qualidade, é possível gerar fluxo sanguíneo cerebral o suficiente para manter um certo nível de consciência. (8) Sabemos que a melhor massagem cardíaca gera apenas em torno de 25 a 40% da FE cardíaca normal, crucial para preservar perfusão cerebral. (9)
Enquanto essa situação pode se tornar bem desconfortável para a equipe assistente, e claro absolutamente horrível para o paciente, NÃO é um marcador de RCE, e os esforços devem continuar até o diagnóstico preciso de RCE ser feito, através do reconhecimento de ritmo organizado e pulso central identificado.
Esse vídeo circulou um tempo atrás na internet, e reproduzo aqui por questões de aprendizado e porque houve desfecho favorável para o paciente graças aos esforços desses socorristas. Observem que o paciente está inconsciente, quando iniciado a massagem cardíaca aos poucos ele vai ganhando movimentação, quando a massagem pára, aos poucos o paciente vai perdendo o tonus muscular e a consciência. Foi questionado que talvez tenha sido adequado verificar a presença de pulso central. Minha opinião pessoal é que esse pessoal fez um excelente trabalho, baseado no que tinham disponível e na emoção do momento: melhor realizar a RCP. Como foi de conhecimento na mídia, esse paciente sofreu um IAM, foi realizado cateterismo e recuperou a capacidade neurológica total. Ou seja, ou se tratava mesmo de uma PCR possivelmente em ritmo chocável ou foi um choque cardiogênico gravíssimo, de toda forma, a massagem cardíaca efetiva, manteve fluxo cerebral por tempo precioso.
Nessas situações podemos usar sedativos como cetamina ou midazolam, durante a reanimação, visando o máximo de conforto possível para o paciente. (13)
TEM PULSO?
Ao final de cada ciclo da RCP fazemos uma pausa nos esforços para avaliar se nosso tratamento teve eficácia, e então o paciente recuperou a circulação espontânea(RCE), ou seja, os batimentos cardíacos. Como sabemos esse tempo precisa ser minimizado o máximo possível para diminuir o tempo sem massagem cardíaca, pois é a manobra que garante fluxo cerebral e aumenta a possibilidade de sobrevida com menos deficit neurológico. Não adianta realiza a desfibrilação, adrenalina, intubação, ultrassonografia, se prejudicarmos o fluxo cerebral colocando em risco a capacidade neurológica do paciente.
A recomendação é que devemos usar menos do que 10 segundos. Lembrando que toda vez que re-iniciamos a massagem cardíaca a pressão de perfusão coronariana (principal marcador de perfusão e sobrevida) aumenta lentamente, não é um aumento abrupto, por isso a importância de manter uma constância e diminuir interrupções.
Pressão de Perfusão Coronarias durante massagem cardíaca
A checagem do ritmo/pulso deve estar já organizado na cabeça da líder antes do momento de terminar o ciclo, já deve ser determinado quem vai assumir a massagem caso necessário, o desfibrilador já deve ser carregado para agilizar a entrega do choque, e uma pessoa experiente deve estar a postos para checar o pulso. De preferência já sentindo o pulso gerado durante a massagem cardíaca para facilitar a localização anatômica. Enquanto não se pode comparar a presença de pulso nesse momento com qualidade da massagem cardíaca e nem com RCE, é uma boa forma de se preparar para a palpação efetiva. Idealmente essa pessoa não deveria ser o líder, mas isso é dependente da quantidade de pessoas na equipe.
No primeiro momento da pausa a atenção deve ser voltada para diagnosticar o ritmo cardíaco. O líder só deve voltar a sua atenção para o pulso, caso seja diagnosticado um ritmo organizado.
Caso seja uma TV/FV, o choque deve ser administrado imediatamente e não há espaço para avaliar se há pulso, para não atrasar o único tratamento eficaz da TV/FV que é a desfibrilação!
Caso o ritmo seja assistolia, a massagem cardíaca deve ser re-iniciada imediatamente e o protocolo da linha reta ser realizado durante a massagem cardíaca, para que não haja comprometimento da PPC.
PSEUDO-AESP
Um dos maiores problemas de deixarmos a avaliação do RCE só a palpação de pulso é o risco de não identificarmos a pseudo-AESP. Isso acontece quando, o paciente volta a apresentar batimento cardíaco, mas em estado muito hipotenso, então o pulso está tão fraco que não conseguimos identificar.
Pseudo-AESP: estado de choque grave com presença de batimento cardíaco em ritmo organizado.
Qual o problema: nesse cenário a RCP e as doses agressivas de adrenalina que fazemos podem ser mais deletéria ao paciente quando neste momento deveríamos estar focados em vasopressor contínuo e terapias adjuntas.
Como diagnosticar: Com ultrassom a beira leito (POCUS), que deve ser posicionado no paciente, já procurando a melhor janela durante a massagem cardíaca, e durante a pausa, com visualização direta do coração, se houver batimento cardíaco, mesmo com ausência do pulso palpável, está diagnosticado pesudo-AESP(10, 11). Também pode ser diagnosticado através de linha arterial (PAI) que mostrara presença de pressão arterial, mesmo que não sinta pulso. Ou através do ETCO2, se apresentar um aumento significado. (12)
Mais detalhes sobre esses dispositivos durante a RCP será apresentado em textos posteriores.
McManus J, Yershov AL, Ludwig D, Holcomb JB, Salinas J, Dubick MA, Convertino VA, Hinds D, David W, Flanagan T, Duke JH. Radial pulse character relationships to systolic blood pressure and trauma outcomes. Prehosp Emerg Care. 2005 Oct-Dec;9(4):423-8. doi: 10.1080/10903120500255891. PMID: 16263676. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/16263676/
Zengin S, Gümüşboğa H, Sabak M, Eren ŞH, Altunbas G, Al B. Comparison of manual pulse palpation, cardiac ultrasonography and Doppler ultrasonography to check the pulse in cardiopulmonary arrest patients. Resuscitation. 2018 Dec;133:59-64. doi: 10.1016/j.resuscitation.2018.09.018. Epub 2018 Sep 22. PMID: 30253230. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30253230/
Yılmaz G, Bol O. Comparison of femoral and carotid arteries in terms of pulse check in cardiopulmonary resuscitation; A prospective observational study. Resuscitation. 2021 Feb 11:S0300-9572(21)00051-4. doi: 10.1016/j.resuscitation.2021.01.042. Epub ahead of print. PMID: 33582255. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33582255/
Graham CA, Lewis NF. Evaluation of a new method for the carotid pulse check in cardiopulmonary resuscitation. Resuscitation. 2002 Apr;53(1):37-40. doi: 10.1016/s0300-9572(01)00487-7. PMID: 11947977. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11947977/
Bobrow BJ, Zuercher M, Ewy GA, Clark L, Chikani V, Donahue D, Sanders AB, Hilwig RW, Berg RA, Kern KB. Gasping during cardiac arrest in humans is frequent and associated with improved survival. Circulation. 2008 Dec 9;118(24):2550-4. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.108.799940. Epub 2008 Nov 24. PMID: 19029463; PMCID: PMC2707277. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19029463/
Berger S. Gasping, survival, and the science of resuscitation. Circulation. 2008 Dec 9;118(24):2495-7. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.108.823203. PMID: 19064691. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19064691/
Olaussen A, Nehme Z, Shepherd M, Jennings PA, Bernard S, Mitra B, Smith K. Consciousness induced during cardiopulmonary resuscitation: An observational study. Resuscitation. 2017 Apr;113:44-50. doi: 10.1016/j.resuscitation.2017.01.018. Epub 2017 Feb 1. PMID: 28161214. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28161214/
Livro Cardiac Arrest
Rabjohns J, Quan T, Boniface K, Pourmand A. Pseudo-pulseless electrical activity in the emergency department, an evidence based approach. Am J Emerg Med. 2020 Feb;38(2):371-375. doi: 10.1016/j.ajem.2019.158503. Epub 2019 Oct 14. PMID: 31740090. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31740090/