Como a arte e sustentabilidade têm o potencial de nos fazer refletir sobre seu impacto na sociedade.
Falamos da natureza como algo distante, em instante nos damos conta que esse é problema da nossa conta. Tanta coisa parece caro, quando na verdade meu caro, a vida é o que a gente tem de mais valioso. Cada árvore que cai, cada rio que seca, é pedaço de nós que se desconecta. Em meio a tanto descarte, quem sabe a arte, nos ajude a lembrar que somos todos parte de mesmo lugar. Bemvindos ao podcast Arte Que Transforma, projeto patrocinado pela Vivo e apresentado por mim, Luiza Adas pesquisadora de arte e cultura, estamos aqui simplesmente em edifício icônico que é a Pinacoteca de São Paulo, pra ser mais precisa a Pina Contemporânea que é o novo edifício da Pinacoteca dedicado a exibir e refletir, apresentar exposições que fazem né a gente olhar pra arte contemporânea através de olhar atualizado com pautas tão importantes e hoje o objetivo desse podcast é trazer, lançálo sobre questões que são importantes pra gente debater na sociedade e que a gente pode utilizar a arte como uma forma de refletir sobre essas questões.
Luiza Adas:Hoje a gente vai falar sobre sustentabilidade com dois convidados incríveis que eu tenho a honra de apresentar pra vocês. Aqui tem ao meu lado Eduardo Surur, se você já andou pela cidade de São Paulo muito provavelmente já esbarrou com alguma obra dele, ele faz intervenções urbanas que fazem a gente pensar sobre a nossa sociedade, sobre o consumo, sobre o consumo, sobre questões relacionadas ao meio ambiente através da arte, então Eduardo super obrigada por aceitar conversar com a gente aqui. E temos também o mundano, esse artista é tão icônico quando a gente fala sobre arte, sobre meio ambiente, o mundano ele tem trabalho super importante não apenas né, dentro da cidade, criando murais, criando obras de arte que fazem a gente olhar o nosso redor de uma forma diferente, como também vai ativamente para as florestas, para os biomas, criando projetos realmente ativos pra mudar toda a questão ambiental que a gente sofre enquanto sociedade e que a gente precisa realmente olhar pra essas questões. Então, Mundano super obrigada também por ter aceitado conversar com a gente hoje, eu estou muito feliz de ter vocês dois aqui, esses convidados não poderiam ter duas pessoas melhores pra falar sobre esse assunto aqui com a gente.
Luiza Adas:E eu quero começar perguntando pra vocês, o que é na visão de vocês o artivismo?
Mundano:Acho que é conceito, pegar no mais básico, né? Arte e ativismo, essa junção de palavras, né? Podese dizer que é neologismo, não existe isso na história da arte, mas diante, né, de tantos desafios que a gente tem, né, globais de meio ambiente e direitos humanos, é esse ativismo usando a arte como essa ferramenta, pra transformação. Então, pra mim, agora trazendo convite pra mim, eu acho que é o que a gente está vivendo hoje na arte, né? No mundo.
Mundano:Se a gente tem lá cem anos atrás, né? Completou aí o modernismo cem anos pra mim a gente já vive a era do ativismo grandes artistas jovens que estão aí em busca se identificando cada vez mais como ativistas porque a gente precisa de todas ferramentas, né? Pra esses desafios ambientais que a gente tem, sociais, enfim, e precisamos da ciência, da tecnologia, de tudo e da arte também, né? Então, eu acho que o ativismo é, vamos dizer, uma corrente atual que está acontecendo, essa palavra já entrou no dicionário espanhol, inclusive, tem muitos estudos, é uma coisa, vamos dizer, recente, mas é mais nome né gente a gente tem muitos ativistas em várias linguagens que já estão há muito tempo né inclusive artistas brasileiros e na música qualquer coisa acho que tem muito mais do que cem duzentos quinhentos anos é só às vezes uma classificação de nome mas é é olhar né e muito legal você começar com essa pergunta aí num podcast assim já trazendo essa reflexão porque tem ido para as escolas professores trazendo. Então acho que, eu acho que existe, porque eu já vi curadores falando, não, nem vem com essa de ativismo que não existe isso aí, isso aí é só, estão inventando, né?
Mundano:E você, o que você acha aí, senhor, desse termo?
Eduardo Srur:Essa denominação, assim como muitas outras, eu sempre tive muita dificuldade de entender as fronteiras, onde começa e onde terminam essas definições, porque no fim das contas a arte, eu e o mundano somos cidadãos do mundo, da rua. Então a gente começou a fazer trabalho que rompe pouco essas fronteiras. E você usou uma palavra que eu sempre pratiquei demais que é as ferramentas. O que que o artista precisa pra fazer uma transformação no mundo? São ferramentas, desde o tempo das cavernas, quando a gente pintava com sangue e carvão, a gente busca formas de reconexão com a natureza.
Eduardo Srur:A gente precisa urgentemente se reconectar com o sagrado e com a natureza. Então, o que é o ativismo? Acho que desde o tempo das cavernas a gente já tinha esse impulso. Uhum. Ou seja, antes mesmo dessa definição, desse nome, essa inquietação que a gente tem de não esperar convite de instituições porque as coisas são urgentes, né, a gente precisa ocupar rio poluído, a gente precisa pôr uma intervenção numa ponte de concreto, mais uma ponte de concreto.
Eduardo Srur:Então todas essas inquietações, me mostram de que antes dessas denominações, os artistas já têm esse impulso de chamar atenção da sociedade pras questões que são urgentes.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Metade dos nossos rios no planeta já estão poluídos, né. A gente mora em São Paulo, a gente tem dois rios metropolitanos que são exemplo dessa desconexão. Então acho que o ativismo vem fazer essa provocação, mesmo antes de ser denominado ativismo.
Luiza Adas:Não, eu sinto também que existe existiu no passado, e acho que agora as instituições vêm se atualizando também, existiu no passado uma repulsa das instituições em olhar a arte também por viés funcional. Era uma coisa que se debateu muito sobre a possibilidade da arte ser algo meramente contemplativo, quando na verdade a arte também pode, porque não ser obviamente contemplativa, mas servir também como uma ferramenta de transformação, né. E eu sinto que é exatamente isso que vocês se propõem enquanto artistas, né, não deixar sua arte dentro da parede da casa de colecionador ali parada, como propor que a gente olhe pra pra pra essa ferramenta como uma ferramenta de empoderamento mesmo da sociedade e das questões que precisam ser debatidas. Uma frase muito interessante que eu vi o mundo falar em uma entrevista quando eu pesquisava, quando eu estava estudando sobre o trabalho de vocês, foi, não vou falar exatamente a frase certinha, mas você diz que você não é ativista defendendo a natureza e sim a própria natureza se defendendo. Eu queria que você comentasse pouco sobre a questão da sua produção artística através desse lugar, né?
Luiza Adas:Como que você se enxerga de fato como parte da natureza e não como uma pessoa, agente externo que precisa defender algo?
Mundano:Verdade, isso aí pra mim é chave, acho que todos os grandes erros humanos, instituições que a gente está fazendo de meio ambiente é porque o ser humano se separa da natureza, né? E isso aí na verdade quem traz essa junção de modo natural são os povos originários povos indígenas que sem se sentem parte da natureza e por isso que eles ali ainda preservam os seus espaços mas é justamente isso as pessoas não você ficar defendendo a natureza eu falei não defendo a natureza a sua natureza porque consultor falou os rios a gente terrou aqui em são paulo os rios vivos os rios estão estão morto a gente está a Amazônia que tem o maior água doce de superfície do mundo doze por cento lá o brasil está seco tá começando a estiagem já tá com os níveis mais baixos da história o cerrado também com a maior seca dos últimos setenta anos Pantanal esse fim de semana tudo deixamos a gente tá se autodestruindo em nome do que dessa ganância de dinheiro e dinheiro não se come quando você está ali com sede com fome você não vai comer dinheiro não vai comer ouro então é realmente eu que tive esse privilégio de poder viajar por esses biomas diversas expedições por muito tempo eu consegui ver essa destruição, não por satélite, mas por baixo.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:De garimpo, de desmatamento, de queimadas. Então assim, eu vi essa autodestruição, e, e tento com a minha arte às vezes usando os próprios pigmentos de crimes ambientais como cinza lama de Brumadinho óleo que vazou no nordeste como uma forma de denúncia mas também de modo mais interessante que acho que a arte permite isso achei excelente que você trouxe aqui muito tempo essa coisa mais da arte contemplativa os lúdico que está nesses espaços expositivos mas tamanha urgência como o próprio Eduardo falou essa urgência que a gente vive a gente tem que usar esses espaços e usar a arte que conecta com emoções das pessoas pra fazer essa transformação essa arte que transforma né? Sim. Então e aí eu sempre tento trazer essa lição. Uma vez que a gente entender que a gente né que somos a natureza tudo que a gente está fazendo que tem impacto ali a gente está se autodestruindo.
Mundano:E essa visão quando desse clique pra mim há muitos anos atrás eu mergulhime ainda mais em tentar reinventar tudo até fazendo uma exposição usando resíduos em todas as partes do do papel que eu fazia o papel da moldura que eu pegava moldura de resíduos do pigmento até do pincel a ideia de não comprar nada levar ao radical a gente justamente ter uma reflexão maior e entender de uma vez por todas que a gente a natureza tem que viver em harmonia como o Eduardo falou a gente fica em São Paulo a gente está de costas pros rios Normalmente sim. O rio você fica de frente é a coisa mais importante. Cidades grandes cidades se envolveram se desenvolveram pela água pelos rios né? Então essa desconexão com o rio é gritante. Ontem eu mesmo estava com indígenas do Guarani do Jaraguá que eles estavam pintando a calha do rio Tietê meio que pedindo quase né pra parar marco temporal monte dessas coisas e a gente vê se fica ali no rio e e parece outro lugar, outra cidade e você vê ali o Rio praticamente morto.
Mundano:Sim. E se a gente tem tecnologia pra fazer tudo que a gente fez hoje, como é que a gente não consegue cuidar dum rio que já nos proveu tanto, né?
Luiza Adas:Com certeza.
Mundano:Então acho que mostra essa desconexão e a arte pode aproximar até. Obras do Sul Húrg, já fez tantas coisas no Rio, né? Você faz as pessoas olharem para os rios.
Eduardo Srur:Sim.
Mundano:Você ainda está com o atelier lá de frente para o Rio?
Eduardo Srur:Sim. Aliás, esse é bom ponto de partida. Porque eu comecei como pintor. Né, eu pinto há mais de trinta anos.
Luiza Adas:Mas
Eduardo Srur:o meu atelier de frente pro Rio Pinheiros, sempre me gerava uma inquietação de poder ver Rio e não usufruir dele. E eu comecei a fazer intervenções no Rio, nos anos dois mil. A minha primeira intervenção que realmente tocava nesse assunto, é da nossa paisagem alterada, dessa desconexão que a gente tem com com o espaço em que a gente vive, trabalha, transita, foram os caiaques em dois mil e quatro. E tudo partiu de uma experiência pessoal.
Luiza Adas:Uhum.
Eduardo Srur:Assim, antes mesmo de eu tomar a decisão de ser artista, eu já tinha uma relação muito intensa com a natureza. Essa pergunta e a resposta do mundano, ele não defende a natureza, a natureza não precisa ser defendida. Quantas extinções o planeta Terra já teve? Se a gente está acelerando a próxima, é é uma questão da humanidade, mas a natureza ela vai se reinventar, e talvez a gente não esteja aqui pra isso. Ou seja, quando eu vi o rio e não podia me conectar com aquele espaço, eu resolvi fazer uma intervenção urbana.
Eduardo Srur:A arte me trouxe uma forma de respirar e de estar dentro de rio que eu não podia nadar nele.
Luiza Adas:Sim. Você pode contar pouco desse dessa intervenção que você fez pra quem está ouvindo a gente e não nunca entrou em contato com esse trabalho?
Eduardo Srur:Sim, claro. Os caiaques, eles eles aconteceram em dois mil e quatro, eu tenho atelier, que eu via o Rio, ainda não existia ciclovia, e eu costumava atravessar a marginal correndo. O meu desafio era chegar na margem do Rio, porque ainda não tinha, tinha o trem mas não tinha grade, não tinha ciclovia. Então a minha missão era chegar no Rio. E aí dia eu resolvi fazer projeto que chamasse atenção da cidade, pra rio invisível, que era o rio Pinheiros.
Luiza Adas:As pessoas passam, passam, passam, passam e não não olham de fato, né?
Eduardo Srur:Não olham de fato e e acho que foi uma transição da pintura. Porque entre a pintura e os caiaques, eu fiz uma obra muito poética que se chamava Acampamento dos Anjos, que de certa forma eu me descolava da do campo
Mundano:bidimensional
Eduardo Srur:e do atelier e enxerguei a cidade como uma tela em branco. Depois das questões que eu resolvi com o acampamento dos anjos, o que ficou muito forte na minha produção e até hoje, é essa essa questão ambiental, né? Como é que a gente chama atenção da sociedade de uma forma, bemhumorada, ou próxima desse universo da arte, porque muitas vezes as pessoas não conseguem explicar e a arte explica. E os caiaques então ocuparam três quilômetros de rio, era manequins de plástico, caiaques coloridos, pra mim era uma grande pintura no espaço público, e eles ficavam inertes, já que nós não podemos navegar, eles vão navegar por nós, o plástico. E aí acho que nasce o plástico na minha produção.
Mundano:E eles encalharam, eu lembro essa foto, eles encalharam meio que num num boiando, tudo bem assim?
Eduardo Srur:Tem, tem isso e eu acho que essa é uma questão interessante pra colocar nesse encontro. O bom profissional sempre está preocupado em falar direito, em manter o controle da situação. As intervenções me mostraram de que isso, não é o melhor. Muitas vezes o profissional perde o controle da situação e essa perda de controle que traz resultado melhor, em outro patamar. É o que aconteceu com os caiaques.
Eduardo Srur:Eu fiquei preocupado em criar uma composição perfeita, num rio contaminado. A primeira chuva que veio, arrastou todos os caiaques e eles se enrolaram numa grande ilha de lixo. E aí as pessoas me ligavam, Surru, como é que você fez essa ilha de lixo? Eu falei, não fui eu, fomos nós. O lixo da cidade destruiu a minha composição.
Eduardo Srur:E eu gostei muito daquilo, aquilo foi muito importante porque eu mostrei de que o público, de que a intervenção urbana, ela tem a mesma dinâmica, organicidade, essa velocidade que tem, a cidade, a vida. E aí no final da exposição a obra ficou de outro jeito, transformado.
Luiza Adas:E você delegou de fato a criação dessa obra pra própria natureza né, então eu acho que a partir do momento que essa paisagem se modificou e esses caiaques eles foram aí encalhando nesse lixo, foi também uma própria, eu imagino assim, você me corrija se eu estiver errada, mas próprio próprio exercício de você como artista de deixar com com que as coisas fluam de acordo com a própria circunstância dali. É como se a natureza tivesse cocriando essa obra com você assim, né?
Eduardo Srur:Foi exatamente isso que aconteceu. Eu perdi o controle da situação, como a gente sempre pensa que tem, mas não tem, e a natureza tomou conta.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:E deixou o recado, né? Eu acho que isso, aquela imagem que você tem de cima, não foi feita por mim, foi feita por fotógrafo, isso foi saiu na primeira página do Estadão na época, é é mapa da América Latina, sem querer aconteceu aquilo. Uhum. Então ali tem a simbologia de de todos os nossos erros
Luiza Adas:Sim,
Eduardo Srur:com certeza. Representados em uma obra de arte.
Luiza Adas:Olha, com certeza. E qual é pra vocês o principal desafio de criar obras de arte urbana com esse viés assim político mesmo assim né, de de pensar todas essas questões, as dificuldades elas vêm por parte do próprio Estado de permitir com que vocês ocupem esse local público ou é das próprias pessoas de verem aquilo? Como que vocês enxergam? Qual é a principal dificuldade?
Eduardo Srur:Que depende muito da natureza do trabalho. O mundano provavelmente vai ter diversas histórias pra contar, mas existem estratégias diferentes. Quando você perguntou sobre o poder público e suas autorizações, muitas obras ficam esvaziadas de significado, você pede autorização. Quando invadiu o Congresso com as boias, não fui pedir licença. Os caiaques precisavam de uma licença, porque eram cento e cinquenta esculturas ali, trabalhadas, projetadas para acontecerem.
Eduardo Srur:Então depende muito da natureza da obra, você acaba fazendo ela subversiva. O touro bandido quando ocupou as vacas da Copa Rage
Luiza Adas:Uhum.
Eduardo Srur:Sem autorização, porque senão a obra perde sentido.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:A a dificuldade que a gente enfrenta, acho que são sempre as mesmas, você ter uma boa ideia, às vezes essa ideia pra se materializar, você tem que ser cara muito resiliente. Tem projetos que levam oito anos, desde a ideia original, até existir como como exposição. E aí você não pode esquecer dessa ideia original, você tem que manter ela e você tem que insistir em jogar isso na sociedade. Eu sempre digo uma coisa, ninguém vai te pedir para ser artista, ninguém vai te pedir para pintar. Essa decisão é sua, é personalíssima.
Eduardo Srur:É.
Mundano:Eu vejo essas diferenças também. Mas o legal é que acho que todos exemplos que a gente deu até agora aqui praticamente foram obras de arte pública. E a gente falando num país onde a arte ainda a arte é muito elitizada né? Né? Tem dado do IBGE antigo que dizia noventa por cento das do povo brasileiro nunca tinha entrado numa galeria ou num museu.
Mundano:Então a arte na rua, a arte pública tem esse papel fundamental de levar o arte acesso das pessoas. Isso começa muito lá atrás com também pichação grafite, artes que também não pedem licença né? Então assim o grafite é na essência é você tomar espaço alheio espaço público e deixar sua mensagem muitas vezes dependendo do que você está fazendo é a única forma que você não vai ter autorização pra fazer aquilo então acho que tem essa linha e hoje quando a gente quer fazer obras mais ousadas, mais radicais ou sei lá, justamente grandiosas tamanho do problema, questionadores, provocadoras, porque o problema é gigantesco. Se eu vou apitar a obra de mil metros quadrados como até vindo pra cá eu vi ela lá obrigadista na floresta eu tinha que pedir autorização é uma coisa que você tem que se ancorar no prédio e tudo uma uma loucura então assim e que tem uma pesquisa enorme a gente tem que pedir autorização mas e sei lá pitaca lama de Brumadinho não é todo prédio que vai autorizar ou eu vou pintar no seu prédio usando a lama do maior crime ambiente sócio ambiental da nossa história até hoje está impune e que isso aqui é uma memória dessas vítimas, já porque até hoje não existe monumento.
Mundano:Então a gente vai colocar aqui toda essa dor aqui das as pessoas não vai autorizar. Então eu comecei a entrar numa de até agora estou fazendo outros processos outros projetos e agora eu falo olha a liberdade de criação para mim é inegociável você pode ver meus últimos trabalhos são esses mas eu não vou te dizer o que eu vou te contar porque como é que eu convencer seiscentas pessoas que mora num prédio com certeza alguém não vai gostar ou já não gosta ou vai falar não quero roxo eu quero verde não tem como você criar essa unidade nessas obras gigantescas esses esses murais essas penas de prédio né que transformou a cidade de são paulo né nesse grande museu só aberto aí então pra mim eu chego já isso é negociável pra mim e tem que ter a liberdade porque cada hora eu estou tentando reinventar no marco 0 de são paulo por exemplo eu fui lá sem a tinta. Eu fui com uma enxada, no marco 0, onde começou a cidade e comecei a cavar a terra. E usei a terra do marco 0 pra pintar uma representação do indígena dizendo que ali São Paulo era a terra indígena e representando usando assim então assim é difícil você explicar e conseguir autorização falando que você vai apitar com a terra ali do lado sabe assim?
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Então eu acho que e ao mesmo tempo né grafite eu assim está falando aqui de meio ambiente de ações positivas pro planeta arte que transforma mas pra cidade de São Paulo eu sou criminoso ambiental que quando você faz grafite a e eu já fui parado e preso várias vezes fazendo isso Lá está dizendo, conspurcar edificações do imobiliários urbanos, né? Sujar, pintar, vamos dizer assim, é crime ambiental. Você está danificando aquela estética do meio ambiente. Uhum. Então eu já assinei crime ambiental.
Mundano:Então essa é a contradição, né?
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Inclusive eu estava pintando os tapumes do teatro municipal. Eu nunca quando fui reformado, nunca apitaria o teatro. Hum. Tapume que é uma coisa temporária que eu acho que ali tem que ter cultura. Já devia vim tapume já com a com projeto de arte junto.
Mundano:E aí estava escrevendo mais cultura e fui preso por exemplo eu assinei crime ambiental e é a mesma cidade que te prende alguns meses depois me convidou para eu ser curador dos tapumes na virada cultural mais de dez anos atrás Então a gente vive essas contradições Sim. Do autorizado e tal porque os artistas não ficam esperando. O artista está à frente do tempo.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Então quando a gente, quando tento eu que meu adoro cores, adoro pintei muito com spray e tal meu trabalho é muito vivo de cores agora eu tenho repensado até o uso de cores de tinta porque tudo isso tem impacto né
Luiza Adas:tem toque segmento tem
Mundano:aí você vai olhar antigamente muitos artistas ficaram intoxicados porque tem é toda toda tinta do pigmento vem ali tem metais pesados agora melhorando pouco enfim mas então eu também estou inventando nada quando eu estou pintando com carvão com cinzas ou com terra esses são os dois pigmentos mais antigos da humanidade né a terra é o primeiro e o carvão o segundo quando a gente vai discutir pichação pichação é a arte com o péssimo na caverna estão pichando a caverna ah isso é vandalismo vandalismo é o que estão fazendo com o rio Tietê com rio Pinheiros vandalismo é isso e não alguém querendo se expressar no mundo que tudo é uma marca que tudo tem que expressar tudo tem que aparecer O 0 jovem, o artista ali está procurando se expressar. E isso é pra mim arte contemporânea, a arte de vanguarda. Uhum. É essa arte que ainda não é entendida. E que aos poucos instituições, principalmente fora do Brasil e mais abertos como a Pinacoteca e outras também vão abrindo e vão entendendo isso mas o artista não espera o artista vai lá e faz diante dessas urgências que a gente vive hoje né?
Luiza Adas:Acho que uma das características mais interessantes pra mim da arte urbana e também principalmente do trabalho de vocês é a característica do trabalho ser trabalho efêmero né, trabalho que não necessariamente vai durar pra sempre ele foi feito e claro existem trabalhos que duram mais tempo outros que duram menos, mas essa essa questão de trazer o impacto, alterar a paisagem urbana e a forma como você enxerga de fato aquele lugar e isso te trazer uma mudança de perspectiva a partir né de lugar que você frequenta diariamente. Qual a importância pra vocês de pensar o local onde essas obras de arte vai ser desenvolvida? É algo que vocês pensam anteriormente, então eu quero que seja aqui porque eu sei que aqui vai causar impacto XYZ ou é a partir das empenas que estão disponíveis na cidade que vocês pensam também o que a mensagem que você que você mudando vai construir ali, como que vocês pensam o local mesmo. No caso, o já falou sobre a questão do Rio, né, que é local que pra grande parte da população é espaço invisível, então eu parto do pressuposto de que você pensa nesse local enquanto local que precisa né, ser olhado, ser debatido, mas eu queria entender de forma geral assim como que vocês enxergam A00 local em relação à produção?
Eduardo Srur:Eu costumo dizer que os lugares me escolhem, porque meu trabalho, ele faz uma ativação em erros urbanísticos. Enquanto você está levantando essa questão, eu lembrei da carruagem na ponte estaiada. Fizeram uma ponte de concreto e virou o símbolo da cidade. Quando o 0 antisímbolo, talvez seja o Rio Pinheiro que está do lado. É, os lugares me escolhem.
Eduardo Srur:Muitas vezes eu fico passando por espaço e tento sair daquela anestesia que que impera e aí de repente é aquele lugar fala, é aqui que você tem que trabalhar, é aqui que você tem que fazer alguma intervenção, é, sei lá, às vezes eu jogo a moto numa numa rua qualquer e entro num buraco, ou tento invadir prédio pra. Ele está me chamando de alguma maneira pra criar uma obra. Você falou dessa dessa questão, ih, me deu
Mundano:branco, esqueci, você
Eduardo Srur:falou tanto.
Mundano:Mas essa coisa de lugar escolher muito
Eduardo Srur:Ah, desculpa, lembrei. O seu trabalho fica muito forte quando eles te prendem e você assina esse crime de denúncia ambiental. É aí que você tem solidez. É mostrar o erro do sistema, mostrar
Mundano:o erro do sistema.
Eduardo Srur:É de currículo artístico, foi a mesma coisa com a âncora no Monumento às Bandeiras. Eu pus a âncora sem autorização, no empurra empurra. Aí depois de quinze dias, era começo de carreira, e tinha toda aquela questão, eu falei, eu estou com estou com vontade de recuperar a minha âncora. Só que quando eu fui retirar a âncora, a polícia me me prendeu. Falou, você não tira essa âncora.
Eduardo Srur:Eu falei, mas por quê? Porque ela é patrimônio histórico da cidade. Eu falei, mas essa âncora foi colocada sem autorização. Por mim. Depois eu eu não disse quem era, mas eu falei, ó, está aqui, ó, uma âncora colocada sem autorização, ah, bom, mas agora ela está aqui, não pode tirar.
Eduardo Srur:Ou seja, o sistema não dá tempo, ele não tem tempo, ele é muito engessado. E a nossa urgência é grande demais.
Mundano:E isso dos lugares para mim, né, tem os privilégios e tudo, pra mim foi o grafite que me levou a ver a cidade por uma outra perspectiva outro olhar né de pintar os viadutos de ir em lugares em nosso da cidade e dessa forma foi que até eu pintei dos lugares que pra mim as mais incríveis que são as carroças os carrinhos dos catadores de materiais recicláveis porque é é uma arte móvel uma arte que circula pela cidade às margens da cidade e fazendo a tal sustentabilidade que todo mundo fala, né? Uhum. Os catadores são responsáveis, catadores e catadoras são responsáveis por mais de noventa por cento do que esse país recicla, passa pela mão deles e são invisibilizados. Aham. Né?
Mundano:Então
Eduardo Srur:O PIB e a Piipe marca roça.
Mundano:O PIB marca roça. Então eu estou há dezesseis anos fazendo esse, mergulhado nesse universo, pintei a imagem quatrocentas carroças por dezenas de cidades, países, porque não é uma coisa exclusiva de São Paulo no Brasil, principalmente no hemisfério sul global mas é é fenômeno mundial inclusive em países desenvolvidos não para de crescer o número de pessoas coletando né? Por uma questão de de fome de urgência e tal mas e pra mim é o lugar mais incrível porque circula muda aí tem coisa dentro e aí tem o 0 ser humano ali que está passando interage e aí que eu entendi até porque eu fazia os grafites e era censurado apagado pela prefeitura com tinta cinza né quando teve cidade limpa e tal e eu fazia muita frase e foi até essas frases de tanto apagar o meu trabalho tem lugar ali em Ibirapuera que eu pintei acho que treze vezes em poucos meses que apagava eu fazia pagava eu fazia que me despertou tanto de fazer mais rápido, de colocar mensagens e de brincar com com isso, com os
Eduardo Srur:seus pagamento.
Mundano:Isso, com esse apagamento, mas com essa essa conversa com o público.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:E aí foi que eu, pintando, resolvi pintar embaixo do viaduto não só o pilar do viaduto mas pintar o carrinho de quem morava ali então eu pedi licença não pra prefeitura, pedi licença pro catador falou posso pintar sua casa? Posso. Posso pintar agora seu carro? Que era a carroça? Posso.
Mundano:E aí apagaram do viaduto e do carrinho não, ele circulava. Enfim, nunca mais parei, estou dezesseis anos, fundei uma organização não governamental, super sólida e importante pro nosso país, né? Que já trabalhou inclusive com mais de três mil artistas, grafiteiros, grafiteiras, ilustradoras, então mais de três mil artistas entraram nessa de também pintar os carrinhos, as carroças, colocando frases, pintar cooperativas, pintou milhares e milhares de metros quadrados neste cooperativo de catadores, aumentando a autoestima dessas pessoas que sofrem preconceito o tempo todo, sendo que na verdade é trabalho honesto eles estão né reciclando preservando recursos naturais estão mitigando a emergência climática então eles são eu costumo falar que eles são super heróis e superheroínas invisíveis que é o pior de super poderes que é invisibilidade e isso pra mim deu uma pintando horas essas carroças eu converso com eles então eu fui formado por esses catadores com uma visão diferenciada de ver nos resíduos valor de ver no descarte dos outros inclusive essa empatia e isso acabou me despertando pra tantos outros projetos de dar valor e de enxergar e e acho que então esse é o lugar acho que mais interessante que eu pintei porque ele é móvel ele é vivo ele dá esse essa possibilidade de acontecimentos como os caiaques que ficam presos coisas que acontecem na cidade tão interagindo aí e muito legal e o legal é ver que isso foi parar em incontáveis escolas e aulas, livros didático, como imagino que a obra do Suru também, então isso a gente tá ensinando, eu não tive isso mesmo com os privilégios de estudar essas obras de artes, né?
Mundano:Pra mim, de uma coisa muito boa, modernismo e tal. Hoje, a gente vê ali professores e professoras falando de ativismo, de cinzas da floresta com o pigmento, criando memória sobre crimes ambientais, e tudo isso de modo leve na verdade, né? A gente fala de coisas duras e pesadas, mas a arte traz essa leveza e uma conexão que muitas vezes textão, uma coisa não vai conseguir trazer.
Eduardo Srur:É, Solewich tem uma frase ótima, né, o artista tem que ser inteligente o suficiente pra saber quando não ser intelectual demais. E eu acho que o nosso trabalho tem essa pegada de falar com a sociedade. Uma coisa que eu queria te perguntar sobre o Pimpimar carroça, é, que eu vi muito e eu continuo vendo a cidade. Então, você criou agentes, por exemplo, o próprio cara que que leva a carroça já não se animou a pintar? Porque eu já vi coisas assim que eu falei foi ele que fez.
Mundano:Sim sim.
Luiza Adas:Exatamente. Foi ele
Mundano:que fez. Eu
Luiza Adas:ia perguntar isso também sobre o empoderamento que você dá
Eduardo Srur:Tirar o público da passividade da passividade. Ele virá
Luiza Adas:A gente
Eduardo Srur:a gente da arte, da obra, do trabalho, que é o que eu fiz, por exemplo, no Congresso em que os trezentos voluntários arremessaram as boias. Ou você planta uma semente. É o Josef Bois, Todo ser humano pode ser artista. A gente tem a capacidade de ser artista. E e através desse pensamento é que eu eu gero as obras.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Por exemplo, faz algum tempo que eu não tenho feito intervenções monumentais. Uhum. Porque o, a periferia me escolheu recentemente. Então agora estou realizando projeto que chama Natureza Plástica, que são obras feitas com fragmentos plásticos que acontecem dentro de escolas municipais, céus, lugares que não recebem cultura. Que é o dado que o mundano colocou aqui, as pessoas não vão aos museus, né?
Eduardo Srur:A população brasileira não consegue chegar na instituição cultural, então a arte vai até lá. E enquanto você está contando a história do Pimpe e marca Rossi, no momento que você dá a ferramenta pro público, e vê eles praticarem, a recompensa é muito é muito gratificante.
Luiza Adas:É, porque a obra de arte ela não é só o desenvolvimento técnico né dessa produção, mas também a própria veiculação disso. Então você transformar, você dizer que o carro né é o veículo pelo qual a arte que você produziu vai se colocar no mundo, isso é algo muito interessante assim. Mas voltando pra pergunta do do Suru que ele te fez, como
Mundano:Sim, do do catador também, se o artista está pintando, sim. Eu acho que uma vez que a gente começa a virar a referência de ter carrinho, vamos dizer, tunado, todo pintado, reformado, cuidado, cultura de segurança, quem não tem, o catador que não foi atendido, pelo projeto vai querer colocar a fita refletiva. E meu no lixo né entre aspas desse termo mas tem de tudo então ele acha tinta ele vai querer pintar e deixar dele legal igual ao outro eu já encontrei catadores que chegaram e falaram meu eu quero que você escreva aquela frase que eu vi há dez ano atrás porque ele falou que iria escreve não sei o quê, que eu sou o campeão da Copa do Mundo da reciclagem. Esses dias eu falei, não, mas agora vai ter Olimpíada, aí escreveu eu sou campeão do Olimpíada da reciclagem, porque não, não sei Mas aí vai criando
Eduardo Srur:O cara consegue fazer tanta coisa ao mesmo tempo.
Mundano:Não, não, eu não consigo nada. Na verdade, o grande segredo que eu aprendi, o meu maior erro, é que eu fiquei cinco anos, por exemplo, pintando as carroças sozinho. E aí, quando a gente faz no coletivo, eu fiz grande chamado coletivo, então a gente tem uma equipe maravilhosa de trinta e três pessoas no no PiV My Carrocha e pra fazer esses prédios contei pela primeira vez com assistente antes eu nunca pintava com assistente então assim a gente realmente não faz nada sozinho olha quanta gente incrível eu tenho aqui atrás câmera aqui. Sim. Pra fazer isso acontecer.
Mundano:É isso. Então acho que esse é o é o segredo de estar fazendo tantas coisas ao mesmo tempo e é isso. Uma vez que a gente coloca essa ideia, outros países, meu, estavam pintando carroça no Afeganistão.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Porque vira uma palestra no TED. Então assim, criou movimento e que eu acho mais incrível, que é essa arte que transforma, a gente está gerando renda. Sim. O fato de eu pintar as carroças, fez catadores que estão ali ajudando famílias a crescer.
Eduardo Srur:É. E com eu
Mundano:eu criei aplicativo pra chamar catadores, você reciclar já que na nossa cidade tem esse grande desafio, né, de da reciclagem. E aí o que acontece é que tem registro de pessoas querendo reciclar e catadores em mais de dois mil municípios do nosso país dentro do aplicativo. Então a gente está fazendo o que o governo não faz, o que os não fazem EE0 que a população que quer sim reciclar começa a fazer. Sim. Então esse é o poder da arte que transforma.
Mundano:Hum. A gente poder gerar renda do que era jogado fora.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:E não tem AAA arte mais sofisticada é o caçador que consegue tirar do descarte dos outros a renda de modo pra sobreviver numa metrópole como a que a gente vive.
Luiza Adas:Com
Mundano:certeza. E e se a gente pensar e eu vejo beleza quando eu vejo uma carga dum catador toda montada, tem todo uma lógica e tem muito sim catadores artistas, pessoas de rua artista que às vezes não tenha a oportunidade então a gente sempre que vê tenta fortalecer e também outros artistas né de isso me fez viajar o Brasil viajar o mundo
Luiza Adas:conectando
Mundano:então acho que é uma troca a gente coloca tudo nossa energia recebe de volta é isso que é o nosso combustível pra continuar essa essa jornada aí.
Luiza Adas:Eu acho muito interessante que o trabalho de vocês dois quebra pouco essa hegemonia que a gente tem na história da arte de que o artista ele é uma figura né, então ele é uma pessoa então é o Van Gogh que é que tem aquela produção e ele é o grande nome que produziu aquelas milhões de obras de arte e é o nome dele que vai estar ali escrito. Eu acho que é muito interessante essa mudança de perspectiva que inclusive os povos originários tinham muito nas suas produções artísticas que não é uma pessoa que assina pela obra, mas sim coletivo. Quando você vê, né, coletivos como o MACU ou outros coletivos indígenas de artistas que se mobilizam para criar uma obra, eles não falam essa obra foi feita por esta pessoa, essa obra foi feita pelo nosso coletivo assim. E eu enxergo que a produção de vocês, embora sim é óbvio, assine como mundano, assine como né Eduardo Surur, vocês têm nas nas respectivas produções de vocês essa característica de pensar essa produção coletiva né, exposição Cinzas na Floresta, foi uma exposição que era projeto seu ali colocado mas que contava com a participação de diversos outros, era coletivo de de artistas ali que estavam produzindo.
Luiza Adas:A própria enxerga que as obras de arte que você cria reproduzindo obras famosas através dos resíduos que você encontra, que você coleta, né, que enfim, trabalho maravilhoso que você faz, no final das contas, é trabalho que não é apenas seu, mas das pessoas que coletaram esses materiais, é trabalho que ele é foi feito em conjunto assim. Então, eu acho isso algo extremamente interessante da produção artística e até pra gente pensar quando a gente fala sobre sustentabilidade, a gente não está só falando sobre o eu, a gente está falando sobre o nosso
Eduardo Srur:Sobre o nosso.
Luiza Adas:Sobre a sociedade como todo, né?
Eduardo Srur:É, essa é como eu falei, eu tenho uma formação de pintor. Eu enxergo até hoje o mundo como pintor. Apesar de eu ocupar a cidade, realizar obras em todos os tipos de linguagem, a minha matriz é a pintura. E eu percebi cedo, no começo da carreira, de que eu não daria para viver só de pintura e pintando sozinho, porque eu costumo dizer que a linguagem de pintura, ela é a mais difícil das artes visuais, porque ela é paciente e solitária. Essa visão do artista sozinho no atelier, ela é muito romântica, não existe mais.
Eduardo Srur:Sim. Você tem que dar passo além, você tem que sair do atelier, você tem que procurar outros profissionais, você tem que se envolver com a sociedade, com outros agentes e fazer o trabalho crescer, criar musculatura.
Luiza Adas:Com certeza.
Eduardo Srur:Pelo menos foi assim que eu enxerguei e foi essa decisão que eu tomei com minha obra. Eu falei, minha obra aqui no atelier não vai sobreviver, eu tenho que levar ela para cidade. Uhum. E tenho que procurar outros profissionais que me ajudem a criar essa essa máquina de produção
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Porque senão a cidade engole você.
Luiza Adas:Com certeza. Uma pergunta que eu ia fazer pra vocês é, eu enxergo que a arte urbana é principalmente voltada pras questões com as quais a gente está abordando aqui, relacionadas a meio ambiente e sustentabilidade, ela precisa ser grito, ela é grito. Como conseguir lançar luz através de obras de arte relacionadas a essas questões em uma cidade tão ruidosa, em uma cidade em que tudo é tão barulhento? Como chamar a atenção?
Eduardo Srur:Não existe uma fórmula, é. O silêncio e a solidão são bens muito preciosos e cada vez mais escassos no século vinte e
Mundano:Uhum.
Eduardo Srur:É, cada obra vai ter uma identidade, acho se você for verdadeiro com a sua produção, no momento que você entrega trabalho, vem aquela coisa que não te deixa ficar quieto. Uma cidade como São Paulo, é, você não vai encontrar em nenhum outro lugar do mundo. Outro dia me perguntaram, ah, mas qual a experiência de fazer exposições em outros países, em outras cidades? Eu falei, São Paulo é a minha matriz, é a minha fonte, onde eu bebo todos os erros que você pode encontrar. Mas ao mesmo tempo ela te dá velocidade, te dá energia dinâmica E e pra você ter trabalho bemsucedido, não sei, você conseguir romper esse ruído e despertar uma consciência, não é escala, porque eu já fiz obras pequenas que tiveram muita ressonância.
Eduardo Srur:Eu não tenho essa forma. Você tem? Como é que você faz trabalho gritar pra sociedade? Uhum.
Mundano:Ah, eu acho que, com certeza é é quando rola essa conexão do que você tá trazendo. Pode ser pequeno, pode ser grande, mas o público conectar ao ponto da dele também querer gritar, né? Uma obra que precisa do espectador pra também existir. Acho que isso é muito importante. E ao mesmo tempo hoje querendo ou não, quando a gente faz uma arte pública na rua, a gente quer que as pessoas estejam lá e vejam ao vivo.
Mundano:A gente busca lugares com bastante concentração de pessoas pra impactar pro grito ir mais longe. Mas a gente não pode ignorar redes sociais ou até a mídia de massa tradicional porque ela consegue também ecoar como megafone. Uhum. Pra todo lugar do mundo então sei lá se eu pinto com a cinzas da Amazônia aqui em São Paulo ah em dois três dias estava escoando no mundo como grito também
Luiza Adas:da floresta de multiplicar né?
Mundano:Se multiplicar E aí como continuar multiplicando, pra mim que ele foi tão visceral pintar com as cinzas, releitura do do lavrador de café de Portinari, falando com o João com o filho pra entender tudo, esse paralelo. E aí sobrou cinzas e meu fiquei vinte e seis dias buscando essas cinzas numa expedição pelo Brasil. E é o que você falou, aí eu falei vou dar pra mais artistas. E aí criei o kit e comecei a distribuir pra quem pedia, não era nem pra convidar os artistas, que quem pedia ganhou cinzas. Aí a gente fez e aí vendemos essas obras e foi pros brigadistas.
Mundano:Maravilhoso. E aí ecoou o tanto que, sei lá, te via lá o Jornal Nacional fazendo uma matéria de três minutos, que é uma coisa muito rara. Ter pouco tempo no jornal e eles porque era tamanha importância e aí ecoou que eu lembro até hoje brigadista que também é outro herói invisível, né?
Luiza Adas:Com certeza.
Mundano:Assim como o catador que ele está se arriscando pra pagar o fogo. Nesse exato momento eles estão combatendo incêndios pelo Brasil todo e aí ele fala porra obrigado, Mondando. Recuou tanto que pela primeira vez minha mãe entendeu o que eu faço. Porque ela ele não entendia. Filho você é louco você fica lá só se ferra ganha mal é voluntário ainda isso era voluntário e tem a risco de se queimar de perder a vida como já aconteceu e aí o fazendeiro por fogo de novo no dia seguinte e e qual que é o seu problema E aí através da arte, do mural, dessa primeira homenagem que eles tiveram, a mãe entendeu e falou, nossa, você é herói.
Eduardo Srur:Funcionou.
Mundano:É, entendeu? A arte conecta. Então assim, eu consegui dar uma forcinha pra monte de brigadista, que se sentiu visível ali. E isso de novo entrando nos livros escolares e tal total EEE fazendo também o quê? Outros tantos artistas a repensar o pigmento, a entender que a gente pode pintar com o que a gente tem né?
Mundano:A gente não precisa ir na loja comprar pigmentos as coisas estão tudo muito caro.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:E se a gente como a gente falou aí de gritar destacar, se está todo mundo fazendo assim buscando o caminho, acho que não é seguindo a multidão, seguindo a tendência. Eu acho que isso Exatamente. Você quer essa questão absolutamente tem que ir contra essa eu me sinto muitas vezes nadando contra a Correnteza, contra a maré e tentando fazer mudança no meu tempo, né? Uhum. E tem que estar pouco à frente do tempo.
Eduardo Srur:Em água suja.
Mundano:Em água suja. Na água suja. Mas é gente ó, acho que olhando todo esse universo que a gente está vivendo a emergência climática que a gente vive desafios estruturais que a gente tem, dívidas do passado, monte de coisa que a gente tem, eu tenho certeza que a arte é uma das principais ferramentas pra gente transformar tudo esses desafios que a gente tem, assim como cada vez mais a tecnologia, assim como a gente a gente precisar precisar de tudo e vai precisar da arte. É. E cada vez mais, claro, o artista tem a sua liberdade de fazer a obra abstrata, lúdica.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Ninguém e tal, mas eu sinto cada vez mais dessa urgência de artistas aliando sua produção a causas. Como uma forma de De despertar mesmo. Despertar. E quando você junta com a causa Uhum. Você ecoa todo mundo que se identifica com essa causa.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Então acho que é essa força coletiva que pode transformar, porque ninguém vai transformar nada sozinho.
Eduardo Srur:É. Muito bom. Isso me lembrou agora, mês passado, eu fiz projeto da natureza plástica num céu que é muito carente, que chama céu uirapuru. Fica na região lá da raposa, e você vai entrando na comunidade antes de chegar no céu, e de repente você vê uma coisa diferente, na periferia da da instituição. Depois que eu comecei a a fazer o projeto lá dentro, conhecer os gestores, os alunos, é projeto que atende mais de quatro mil crianças, só esse ano.
Eduardo Srur:Eu descobri de que eles estavam fazendo projeto paralelo que chamava Céu Verde. Há mais de dez anos, eles estavam plantando mudas de árvores, e essas árvores foram crescendo contra todos os riscos, né? A prefeitura vai lá e corta, o outro vai lá e corta e e pisa na árvore, mas você sentia o 0 frescor? Sim. E mudou tudo.
Eduardo Srur:Aí, eu fiz a exposição com o trabalho dos alunos, e foi uma equipe de televisão, e fez a entrevista sobre o projeto, sobre as questões que envolviam o projeto Natureza Plástica, e quando eles descobriram o céu verde, eles fizeram, mas isso é maravilhoso. E aí eles fizeram a entrevista sobre o céu verde. Isso deu voz pra todas as pessoas que estavam fazendo esse projeto lá. A matéria que foi na TV, foi sobre o céu verde.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Isso foi bárbaro.
Luiza Adas:Ou ampliou a voz que eles já têm, né?
Eduardo Srur:É, eles tinham uma presença local, mas na hora que eles se entendem como como agentes na mídia.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Então, a mãe de alguém,
Luiza Adas:o
Eduardo Srur:filho de alguém, viu o esforço, viu o trabalho, porque provavelmente o cara que plantou dez mil árvores e mataram cinco mil, ô cara, para de plantar árvore, não, vou continuar.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:E aí vem esse essa recompensa. E eu vi isso agora. E foi muito bom porque eu já, esse lance do ego, de você querer estar em frente, de todo esse palco, eu acho muito mais interessante você ter a coletividade.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:As crianças se tornam artistas? Os trabalhos ficam às vezes melhor do que o seu?
Luiza Adas:Sem dúvida.
Eduardo Srur:E você vai misturando tudo isso, diluindo as barreiras?
Luiza Adas:E o trabalho é nosso, né, não é de
Eduardo Srur:É vira trabalho comum.
Luiza Adas:Com certeza.
Eduardo Srur:Isso é bem interessante.
Luiza Adas:Bom infelizmente estamos nos direcionando aí pros minutos finais do nosso papo, mas eu queria perguntar pra vocês assim, pra finalizar, se a visão de vocês é otimista ou pessimista em relação à junção entre arte e sustentabilidade. Vocês veem cada vez mais artistas se debruçando em relação a essa temática ou você acha que a gente ainda precisa cada vez mais obviamente todo mundo, acho que todos nós concordamos que precisamos cada vez mais de artistas dispostos a debater esse esse assunto, mas eu queria entender que que vocês enxergam sobre o futuro dessa temática que a gente abordou do episódio de hoje.
Eduardo Srur:Como eu disse, foi processo muito orgânico na minha vida. Realmente são questões que me incomodavam, que continuam me incomodando. Se você me pergunta se a minha visão é otimista ou pessimista, em relação à arte ser uma ferramenta de transformação e de consciência, com certeza é positiva. Sim. Outro dia eu estava lendo o livro do Hammeway, O Velho e o Mar.
Eduardo Srur:Uhum. Tem momento em que ele está lutando contra o peixe, e o peixe é enorme. E aí, ele tem a mão destra, paralisada, né, fica com câimbra, começa a sangrar, e ele começa a reclamar daquilo. Ele começa a falar que aquela mão não presta e que ele vai perder a luta. Só que aí ele se lembra que ele tem a mão esquerda, e ele continua a luta.
Eduardo Srur:Ou seja, qual que é qual que é a mensagem disso? Pare de pensar naquilo que você não tem, e comece a fazer alguma coisa com aquilo que você tem. Eu acho que a arte, ela pode fazer mudanças, ela traz uma consciência com uma linguagem que todos podem entender, né? Você pode gerar transformações que são necessárias, são urgentes, como eu falei no começo.
Mundano:É, eu sou meio realista positivista, mas quando eu sou realista, e justamente de eu ter tido esse privilégio de circular os lugares ver rios secos queimando andar por lugares andar na lama de Brumadinho assim tantas coisas horríveis que eu vi nas coisas do meio ambiente e ver essa destruição sendo realista a gente está praticamente passou do ponto de não retorno
Eduardo Srur:que só
Mundano:pioraria pantanal gente quem não foi ver as harpa que ele pode escrever que ele está sumindo, está secando.
Eduardo Srur:Está secando.
Mundano:Então assim, estão sendo realista de ter visto, eu gosto de ver com os meus olhos, a gente está indo muito mal. Esses fenômenos causados pela ganância humana, tornam a emergência climática uma realidade que impacta milhões de pessoas todos os dias, né? Enchentes, secas severas, enfim. Então sendo realista eu acho que a gente vai muito mal. Ao mesmo tempo eu vejo essa produção cada vez mais artistas fazendo trabalhos com registros com meio ambiente tentando aí a fazer as pessoas vamos dizer acordarem despertarem por uma mudança de hábitos né?
Mundano:Cada vez melhor. E a gente vê quando algo ecoa por ali, sei lá, faço tsunami de plástico quantas pessoas, nossa, é isso aí e tal. Mas mas eu eu vejo que é suficiente. Várias coisas que eu fiz as pessoas, nossa, que incrível, genial aqueles comentários de rede social. Mas aí, o que mudou?
Mundano:Você caiu com a tocha numa performance, fez monte de protesto contra o meio ambiente, oito anos atrás, mas o que mudou?
Eduardo Srur:É.
Mundano:Não mudou nada, então
Luiza Adas:Difícil conseguir mentir Pra
Mundano:que você fez isso, mas aí eu digo, por por que que eu sou positivo isso? Porque no fim das contas, essa a gente, isso que fez a gente estar aqui hoje, de alguma forma, esse é o tema que você está trazendo no Arte Que Transforma, isso está nas escolas, professores estão achando interessante, está nos livros didático, cai na prova. Então assim, eu sou esperançoso com essa criançada, com esse futuro. Porque eles estão tendo aula de artes, outras coisas, entendendo a urgência, entendendo a mudas climática, o racismo estrutural, enfim, todas essas absurdos que a gente ainda vive hoje em dia. Então eu acho que vai vim melhor e vai ter que se a gente acha que hoje é extremamente urgente as crianças ali elas vão brigar pelo futuro delas.
Luiza Adas:Sim.
Mundano:Porque ela que está em jogo. Tem gente aqui vivendo como se está nem aí, mas a criançada está mais aguerrida, vai estar mais engajada. Sim. E eu acho que é é aí que vem essa grande mudança e cada vez mais entendendo que né? Não estamos aqui no Arte Que Transforma defendendo a natureza não, a gente é a natureza e está se defendendo.
Luiza Adas:É Que assim seja gente, que aula que a gente teve aqui hoje com vocês Finalzinho. Por favor.
Eduardo Srur:Concordo com o mundano, a nossa humanidade é uma locomotiva, a todo vapor, e movido a carvão. Mas a arte salva. A arte é uma possibilidade de salvamento, é uma possibilidade de resgate, da percepção do que nós realmente somos, em essência. Então, a gente não pode desistir, a gente tem que continuar deixando essa mensagem e que as futuras gerações, que é a única coisa que a gente pode acreditar e que vai valer a pena, entendam.
Luiza Adas:Sim.
Eduardo Srur:Eu penso que o meu caminho, assim como o do mundano, são trilhas, alternativas pras futuras gerações. Se alguém quiser ser artista, ele pode. Não só porque o Josef Boyce disse, mas porque a gente está deixando dois exemplos de que é possível Uhum. Você acreditar em ser artista e causar reflexão.
Luiza Adas:Com certeza, a arte salva. Obrigada pelo seu trabalho, obrigada demais, Mondando, que aula que a gente teve hoje, é é muito realmente transformador e eu fico muito contente que a gente possa utilizar esse nome como nome do podcast arte que transforma porque a ideia é que cada pessoa que ouça esse conteúdo possa também pensar na sua própria transformação e na transformação que quer ver no mundo através da voz de vocês e de outras pessoas que a gente vai ter hoje. Quero agradecer demais a você que ouviu a gente, especialmente ao Mundano, ao Eduardo que colaboraram, que trouxeram aqui o trabalho deles pra gente ouvir, que vocês continuem fazendo esse trabalho maravilhoso. A gente vai estar aqui acompanhando. Eu vou deixar as redes sociais de vocês aqui para as pessoas também poderem seguir, acompanhar e ver o trabalho que vocês fazem.
Luiza Adas:E nos próximos episódios a gente vai conversar mais sobre arte sustentabilidade com convidados incríveis. Então já segue podcast pra não perder nada e por enquanto se você quiser acompanhar mais sobre o que rola em algum dos principais museus do Brasil, a fora que são patrocinados pela Vivo, dá uma olhada no Instagram da Vivo Cultura e no meu perfil Luizaadas, que lá você vai encontrar vários conteúdos relacionados a essa temática. Beijos e eu vejo vocês na próxima.